Manuel BandeiraAmo-te quanto em largo, alto e profundo
Minh’alma alcança quando, transportada,
Sente, alongando os olhos deste mundo,
Os fins do Ser, a Graça entressonhada.
Amo-te em cada dia, hora e segundo:
À luz do sol, na noite sossegada.
E é tão pura a paixão de que me inundo
Quanto o pudor dos que não pedem nada.
Amo-te com o doer das velhas penas;
Com sorrisos, com lágrimas de prece,
E a fé da minha infância, ingênua e forte.
Amo-te até nas coisas mais pequenas.
Por toda a vida. E, assim Deus o quisesse,
Ainda mais te amarei depois da morte.
Dá-me tua mão
E eu te levarei aos campos musicados pela canção das colheitas
Cheguemos antes que os pássaros nos disputem os frutos,
Antes que os insetos se alimentem das folhas entreabertas.
Dá-me tua mão e eu te levarei a gozar a alegria do solo agradecido,
Te darei por leito a terra amiga e repousarei tua cabeça envelhecida Na relva silenciosa dos campos.
Nada te perguntarei, apenas ouvirás o cantar das águas adolescentes
E as palavras do meu olhar sobre tua face muito amada.
E se um dia um demônio se esgueirasse em tua mais solitária solidão e te dissesse:
" Esta vida, assim como a vives e sempre viveste, terás de vivê-la ainda uma vez e ainda inúmeras vezes, não haverá nela nada de novo!
Cada dor, cada pensamento, tudo que há de pequeno em tua vida há de retornar. Tudo, na mesma ordem e seqüência. E, do mesmo modo, esse instante e eu próprio: o demônio. O eterno relógio da existência reiniciará outra vez a contagem do seu tempo, e do tempo das tuas desgraças.”
Não te lançarias ao chão rangendo os dentes e amaldiçoando o demônio?
Não, não. Responderias medrosamente que nunca te disseram algo mais divino. Diga, nunca te disseram algo mais divino?
Mentirias que queres para sempre a tua própria desgraça? Vê bem, se disseres que sim, estarás apenas piorando a eternidade.
Se você puder não fazer coisa alguma, isso é o melhor.É necessário ter muita coragem para não fazer coisa alguma.Para fazer, não é preciso ter muita coragem, porque a mente é uma fazedora. O ego sempre anseia fazer algo; mundano ou não mundano, o ego sempre deseja fazer algo. Ao fazer alguma coisa, o ego se sente adequado, saudável, em movimento, deliciando-se consigo mesmo. Não fazer coisa alguma é o que há de mais difícil no mundo, e, se você conseguir, isso é o melhor.A própria idéia de que precisamos fazer algo está basicamente errada. Precisamos ser, não fazer. Tudo o que sugiro que as pessoas façam é apenas para que venham a conhecer a futilidade do fazer, de tal modo que um dia, a partir do puro cansaço, elas caiam no chão e digam: "Agora chega! Não queremos fazer coisa alguma!" E o trabalho real começará. O trabalho real é apenas ser, porque tudo aquilo de que você precisa já está dado, e tudo aquilo que você possa ser já é.Você ainda não sabe, isso é verdade.
Assim, o que é necessário é estar em um tal espaço de silêncio que você possa cair em si mesmo e perceber o que você é.
É preciso ser leve como uma brasa, não como uma chama. Leve como um aceno, não como um grito. Leve como uma horta, não como um jardim. Leve como um livro, não como uma página. Leve como um poema, não como um verso. Leve como uma duna, não como o vento. Leve como um vestido, não como um lenço. Leve como o cristal, não como o vidro. Leve como o pão, não como a migalha. Leve como um temporal, não como o relâmpago. Leve como o varal, não como o casaco. Leve como o telhado, não como a telha. Leve como uma árvore, não como o fruto. Leve como o caroço, não como o inseto. Leve como as mãos, não como a aliança. Leve como o mar, não como a espuma. Leve como uma geada, não como a nuvem. Leve como vinho, não como a fumaça. Leve como a ofensa, não como o elogio. Leve como o clarão, não como a lâmpada. Leve como a pá, não como a faca. Leve como o cavalo, não como a lã. Leve como o armário, não como a gaveta. Leve como o moinho, não como o chapéu. Leve como o rosto, não como o pente. Leve como o mel, não como abelhas. Leve como a rocha, não como a erva. Leve como uma varanda, não como a janela. Leve como a voz, não como o silêncio. Leve como a meia-noite, não como o meio-dia. Leve como a despedida, não como a volta. Leve como uma casa, não como um quarto. Leve como as córneas, não como as moedas. Leve como um corredor, não como um quadro. Leve como uma escada, não como um degrau. Leve como uma mesa, não como o prato. Leve como o caráter, não como a opinião. Leve como uma fome, não como o apetite. Leve como desejo, não como a vontade. Leve como o amor, não como a paz. Leve como o corpo, não como o sangue. Leve como uma porta, não como um pêndulo. Leve como o inverno, não como o verão. Leve como a confidência, não como o segredo. Leve como a alegria, não como a euforia. Leve como a memória, não como a papoula. Leve como o balanço, não como a corda. Leve como a insistência, não como a dúvida. Leve como um casal, não como a solidão. Leve como a boca, não como a língua. Leve como a música, não como a palavra. Leve como a migração, não como o pássaro. Leve como o ninho, não como o ramo. Leve como a pata, não como a asa. Leve como uma cicatriz, não como o traço. Leve como o espanto, não como a reza. Leve como o medo, não como um morto. É preciso ser denso para ser leve.
“Entre o sono e o sonho, entre mim e o que em mim é o quem eu me suponho, corre um rio sem fim”. Fernando Pessoa, inspirado poeta, leitor sensível da alma humana, pode traduzir com sutileza o desafio de cada existência. Onde se dará nosso despertar de compreensão?
Vamos de crises em crises aprendendo aos tropeços, sofrendo de ansiedade, estresse e cansaço. É preciso compreender que não é a crise que nos encontra, somos nós que a produzimos. Isso se dá porque não fluímos bem nos movimentos da mudança, nesse rio sem fim a que costumamos chamar vida.
A mudança é o ritmo no qual o mundo caminha e só há um jeito de se dar bem com ela, aprendendo a mudar também. O maior paradoxo, a contradição mais coerente da mudança, é que é preciso mudar para ser quem se é. É preciso deixar de ser quem não somos, de fazer o que não queremos e viver o que não gostamos. Se olharmos atentamente nossa realidade, vamos perceber que muitas coisas em nosso dia a dia se encaixam nessa definição que é contrária à nossa natureza.
É urgente nos armarmos de coragem e irmos à busca de nós mesmos. É prioritário definir o que vamos fazer com o tempo que nos foi dado. É fundamental acordarmos do sono ilusório da realidade para vivermos na prática o sonho que nos comove. A crise é apenas um sinal na estrada dizendo que é hora de rever o caminho. Vá em busca de si mesmo e não tenha medo dos desafios e das incertezas, pois as asas só aparecem quando o chão desaparece.