domingo, 23 de maio de 2010

Castro Alves



São duas flores unidas,
São duas rosas nascidas
Talvez do mesmo arrebol,
Vivendo no mesmo galho,
Da mesma gota de orvalho,
Do mesmo raio de sol.

Unidas, bem como as penas
Das duas asas pequenas
De um passarinho do céu...
Como um casal de rolinhas,
Como a tribo de andorinhas
Da tarde no frouxo véu.

Unidas, bom como os prantos,
Que em parelha descem tantos
Das profundezas do olhar...
Como o suspiro e o desgosto,
Como as covinhas do rosto,
Como as estrelas do mar.

Unidas... Ai quem pudera
Numa eterna primavera
Viver, qual vive esta flor.
Juntar as rodas da vida,
Na rama verde e florida,
Na verde rama do amor!

terça-feira, 18 de maio de 2010

Martha Medeiros

Doidas e Santas

Pra começo de conversa, não acredito que haja uma única mulher no mundo que seja santa. Os marmanjos devem estar de cabelo em pé: como assim, e a minha mãe??? Nem ela caríssimos, nem ela. Existe mulher cansada, que é outra coisa. Ela deu tanto azar em suas relações que desanimou. Ela ficou tão sem dinheiro de uns tempos pra cá que deixou de ter vaidade. Ela perdeu tanto a fé em dias melhores que passou a se  contentar com dias medíocres. Guardou sua loucura em alguma gaveta e nem lembra mais. Santa, mesmo, só Nossa Senhora, mas, cá entre nós, não é uma doideira o modo como ela engravidou? (Não se escandalize, não me mande e-mails, estou brin-can-do.) Toda mulher é doida. Impossível não ser. A gente nasce com um dispositivo interno que nos informa desde cedo que, sem amor, a vida não vale a pena ser vivida, e dá-lhe usar nosso poder de sedução para encontrar the big one, aquele que será inteligente, másculo, se importará com nossos sentimentos e não nos deixará na mão jamais. Uma tarefa que dá para ocupar uma vida, não é mesmo? Mas, além disso, temos que ser independentes, bonitas, ter filhos e fingir de vez em quando que somos santas, ajuizadas, responsáveis, e que nunca, mas nunca, pensaremos em jogar tudo pro alto e embarcar num navio pirata comandado pelo Johnny Depp, ou então virar louca e cafetina, ou sei lá, diga aí uma fantasia secreta, sua imaginação deve ser melhor que a minha. Eu só conheço mulher louca. Pense em qualquer uma que você conhece e me diga se ela não tem ao menos três dessas qualificações: exagerada, dramática, verborrágica, maníaca, fantasiosa, apaixonada, delirante. Pois então. Também é louca. E fascina a todos. Todas as mulheres estão dispostas a abrir a janela, não importa a idade que tenham. Nossa insanidade tem nome: chama-se Vontade de Viver até a última gota. Só as cansadas é que se recusam a levantar da cadeira para ver quem está chamando lá fora. E santa, fica combinado, não existe. Uma mulher que só reze, que tenha desistido dos prazeres da inquietude, que não deseje mais nada? Você vai concordar comigo: só se for louca de pedra…

quarta-feira, 12 de maio de 2010

Escolha


- Quando ela virá?
- Não sei. Decidi esperá-la!
- Todos os dias?
- Não. Só hoje...

terça-feira, 11 de maio de 2010

Rita Apoena


Será que, às vezes, a gente vai com tanta pressa ao encontro de alguém que se esquece de se levar junto? Será que o Sol, quando é muito forte, faz a sombra chegar primeiro do que a gente?

Quanto tempo a gente leva para repousar os olhos nas pessoas ao nosso redor? E ir deslizando pelos pequenos detalhes, na beleza não manifesta e, ao mesmo tempo, ofuscante? Quanto tempo a gente leva para repousar os olhos nos olhos do outro, sem qualquer pressa, sem procurar ali dentro o próprio reflexo?

Há sempre alguma janela nas paredes, ainda que pequenina.

Hoje eu comprei sementes de girassol. Há isso de extraordinário no mundo. Quando alguém se sente só ou com saudade de outrem pode comprar sementes de girassol para vê-lo crescer. Se me ocupo da semente é porque escuto o seu silêncio. O silêncio com que ela abraça, tão brandamente, o seu grãozinho de terra.

Nenhum amor floresce preso numa casa, sem contemplar, por instantes, a luz de uma tarde... Então, guardei aquela fotografia por dentro dos meus olhos para quando eu olhar você. E você, como sempre, não me responder palavras, não me escrever palavras, mas quando o sol for sumindo, me estender sorrindo o seu cachecol xadrez.

Sabe, acho que ninguém vai entender. Ou se entender não vai aprovar. Existe em nossa época um paradigma que diz: enquanto você me der carinho e cuidar de mim, eu vou amar você. Então, eu troco o meu amor por um punhado de boas ações. Isso a gente aprende desde a infância: se você for um bom menino, eu vou lhe dar um chocolate. Parece que ninguém é amado simplesmente pelo que é, por existir no mundo do jeito que for, mas pelo que faz em troca desse amor. E quando alguém, por alguma razão muito íntima, corre para bem longe de você? A maioria das pessoas aperta um botão de desliga-amor, acionado pelo medo e sentimentos de abandono, e corre em direção aos braços mais quentinhos. E a história se repete: enquanto você fizer coisas por mim ou for assim eu vou amar você e ficar ao seu lado porque eu tenho de me amar em primeiro lugar. Mas que espécie de amor é esse? Na minha opinião, é um amor que não serve nem a si mesmo e nem ao outro.

Não estou falando de um mundo cor-de-rosa ou de pessoas perfeitas, sempre prontas para nos acolher, amar, caminhar ao nosso lado. Não falo disso, mas da tristeza nos olhos de quem vira as costas e a gente não vê. A beleza por dentro de um peito encouraçado que a gente não sente. A solidão de quem afasta um amor e se deita em camas tão frias. É do instante quando os olhos se perdem no nada e nenhuma mentira é capaz de enganar si mesmo. É desse instante solitário, desse instante sem abraço, que eu digo. Todo mundo vai virar as costas ou dizer que merece coisa melhor ou debochar das mentiras que eles contaram... mas a gente pode sempre voltar e acolher com amor, ser os primeiros a começar. Afinal, se a hostilidade do mundo despertar a nossa, quem vai ser o primeiro a sorrir?

Então, quando você me beijar,vai sentir o gosto da minha escrita, pois a fim de nunca esquecê-las eu trago todas as minhas palavras na ponta da língua.

— E você, por que desvia o olhar?(Porque eu tenho medo de altura. Tenho medo de cair para dentro de você. Há nos seus olhos castanhos certos desenhos que me lembram montanhas, cordilheiras vistas do alto, em miniatura. Então, eu desvio os meus olhos para amarrá-los em qualquer pedra no chão e me salvar do amor. Mas, hoje, não encontraram pedra. Encontraram flor. E eu me agarrei às pétalas o mais que pude, sem sequer perceber que estava plantada num desses abismos, dentro dos seus olhos.)



domingo, 9 de maio de 2010

Martha Medeiros

Normose

Lendo uma entrevista do professor Hermógenes, 86 anos, considerado o fundador da ioga no Brasil, ouvi uma palavra inventada por ele que me pareceu muito procedente: ele disse que o ser humano está sofrendo de normose, a doença de ser normal. Todo mundo quer se encaixar num padrão. Só que o padrão propagado não é exatamente fácil de alcançar. O sujeito 'normal' é magro, alegre, belo, sociável, e bem-sucedido. Quem não se 'normaliza' acaba adoecendo. A angústia de não ser o que os outros esperam de nós gera bulimias, depressões, síndromes do pânico e outras manifestações de não enquadramento. A pergunta a ser feita é: quem espera o que de nós? Quem são esses ditadores de comportamento a quem estamos outorgando tanto poder sobre nossas vidas?
Eles não existem. Nenhum João, Zé ou Ana bate à sua porta exigindo que você seja assim ou assado. Quem nos exige é uma coletividade abstrata que ganha 'presença' através de modelos de comportamento amplamente divulgados. Só que não existe lei que obrigue você a ser do mesmo jeito que todos, seja lá quem for todos. Melhor se preocupar em ser você mesmo.
A normose não é brincadeira. Ela estimula a inveja, a auto-depreciação e a ânsia de querer o que não se precisa. Você precisa de quantos pares de sapato? Comparecer em quantas festas por mês? Pesar quantos quilos até o verão chegar?
Não é necessário fazer curso de nada para aprender a se desapegar de exigências fictícias. Um pouco de auto-estima basta. Pense nas pessoas que você mais admira: não são as que seguem todas as regras bovinamente, e sim aquelas que desenvolveram personalidade própria e arcaram com os riscos de viver uma vida a seu modo. Criaram o seu 'normal' e jogaram fora a fórmula, não patentearam, não passaram adiante. O normal de cada um tem que ser original. Não adianta querer tomar para si as ilusões e desejos dos outros. É fraude. E uma vida fraudulenta faz sofrer demais.
Eu não sou filiada, seguidora, fiel, ou discípula de nenhuma religião ou crença, mas simpatizo cada vez mais com quem nos ajuda a remover obstáculos mentais e emocionais, e a viver de forma mais íntegra, simples e sincera. Por isso divulgo o alerta: a normose está doutrinando erradamente muitos homens e mulheres que poderiam, se quisessem, ser bem mais autênticos e felizes.

quinta-feira, 15 de abril de 2010

Helena Elis


Eu gosto do claro quando é claro que você me ama
Eu gosto do escuro no escuro com você na cama
Eu gosto do não se você diz não viver sem mim
Eu gosto de tudo, tudo o que traz você aqui
Eu gosto do nada, nada que te leve para longe
Eu amo a demora sempre que o nosso beijo é longo
Adoro a pressa quando sinto
Sua pressa em vir me amar
Venero a saudade quando ela está pra terminar
Baby, com você já, já

Mande um buquê de rosas, rosa ou salmão
Versos e beijos e o seu nome no cartão
Me leve café na cama amanhã
Eu finjo que eu não esperava
Gosto de fazer amor fora de hora
Lugares proibidos com você na estrada
Adoro surpresas sem datas

Chega mais cedo amor
Eu finjo que eu não esperava

Eu gosto da falta quando falta mais juízo em nós
E de telefone, se do outro lado é a sua voz
Adoro a pressa quando sinto
Sua pressa em vir me amar.





sexta-feira, 9 de abril de 2010


Mia Couto



...Qualquer coisa
pergunta-me qualquer coisa
uma tolice
um mistério indecifrável
simplesmente
para que eu saiba
que queres ainda saber
para que mesmo sem te responder
saibas o que te quero dizer...

Mário Quintana


Que esta minha paz e este meu amado silêncio
Não iludam a ninguém
Não é a paz de uma cidade bombardeada e deserta
Nem tampouco a paz compulsória dos cemitérios
Acho-me relativamente feliz
Porque nada de exterior me acontece...
Mas,
Em mim, na minha alma,
Pressinto que vou ter um terremoto!

sábado, 27 de março de 2010

Renato Russo



Faço nosso o meu segredo mais sincero
E desafio o instinto dissonante.
A insegurança não me ataca quando erro
E o teu momento passa a ser o meu instante.
E o teu medo de ter medo de ter medo
Não faz da minha força confusão
Teu corpo é meu espelho e em ti navego
E eu sei que a tua correnteza não tem direção.

JG de Araujo

Quando se ama, no silêncio as coisas falam melhor.

segunda-feira, 22 de março de 2010

Mário de Andrade




Contei meus anos e descobri que terei menos tempo para viver daqui para frente do que já vivi até agora.  Tenho muito mais passado do que futuro. Sinto-me como aquele menino que recebeu uma bacia de cerejas. As primeiras, ele chupou displicente, mas percebendo que faltam poucas, rói o caroço. Já não tenho tempo para lidar com mediocridades. Não quero estar em reuniões onde desfilam egos inflamados. Inquieto-me com invejosos tentando destruir quem eles admiram, cobiçando seus lugares, talentos e sorte. Já não tenho tempo para conversas intermináveis, para discutir assuntos inúteis sobre vidas alheias que nem fazem parte da minha. Já não tenho tempo para administrar melindres de pessoas, que apesar da idade cronológica, são imaturos. Detesto fazer acareação de desafetos que brigaram pelo majestoso cargo de secretário-geral do coral. 'As pessoas não debatem conteúdos, apenas os rótulos'. Meu tempo tornou-se escasso para debater rótulos, quero a essência, minha alma tem pressa...  Sem muitas cerejas na bacia, quero viver ao lado de gente humana, muito humana; que sabe rir de seus tropeços, não se encanta com triunfos, não se considera eleita antes da hora, não foge de sua mortalidade, caminhar perto de coisas e pessoas de verdade. O essencial faz a vida valer a pena. E para mim, basta o essencial!

Fabrício Carpinejar



O sexo é uma verdade privada que se torna mentira pública.
Na hora de fazer, a franqueza. Na hora de contar, a distorção.
Há um mito de que qualquer transa atravessa a madrugada. Não conheço guepardo, mas somente maratonista na cama. Ejaculação precoce é o de menos, o domínio é da ejaculação retardada. Não há um amigo que diga que transou quinze minutos. Nunca. São sempre horas e horas de carícias e afagos e preliminares.
Ou todos usam Viagra ou todos mentem.
Não sei se o brasileiro é o melhor amante. Não existe como saber. A única pesquisa de opinião confiável é a feita com Deus após a morte e, até agora, não foram anunciados os resultados. Não há boca-de-urna confiável da intimidade.
Corre sempre o boato de que o prazer se estende ao canto do galo. Eu olho para a cara dos meus colegas e não enxergo nenhuma olheira, nenhuma fraqueza de manhã. São sobrenaturais. Passam a noite fogosamente, não dormem e ainda acordam sem efeitos colaterais do cansaço. Alguma coisa está errada em mim.
Pior que fingir orgasmo é fingir que o orgasmo dura a noite inteira.
Onde anda a modéstia da nudez? A humildade do amor?
O bocejo, por exemplo, é tão romântico, mas é visto como um sinal de agouro e de tédio. Se alguém vacila, logo se pune e engole uma lata de Red Bull. Abafamos a sedução da preguiça. Uma pena; ao bocejar, o corpo se estica e se entrega como num ato erótico. Nada é mais excitante do que estar desarmado, com o rosto limpo, honesto e real.
O sexo precisa de mais religião. Pode parecer blasfêmia, mas pede mais religião e menos academia de ginástica. Sexo virou desempenho. É uma atividade muscular, ao lado do cross over e leg press. Uma demonstração de fôlego. Uma competição de quem aguenta mais. De quem pode mais. Uma rivalidade de bíceps e seios. Estamos mais preocupados com a posição do que com o prazer do outro. Os joelhos e braços são anilhas encaixadas nas barras.
Esquecemos de que o sexo pode ser curto no tempo e intenso na entrega. Já é suficiente meia hora, desde que vivida com a disposição dos detalhes, desde que a respiração seja saboreada e a pálpebra se feche para deixar o lábio enxergar sozinho.
Parece que sexo exige insônia, exaustão física, tortura, infarto. Eu quero viver pelo sexo, não morrer dele.
A noite de núpcias é a mesma conversa fiada. Os convidados e os padrinhos farão insinuações aos casados durante a festa: “Hoje é o dia, hein?” Mas no quarto a verdade será sonolenta. Ao invés de gemidos, roncos.
Depois do casamento, da recepção, da comilança, da arruaça até a luz do sol chegar, das danças e das despedidas dos hábitos de solteiro, como é que o casal vai transar? É desumano. Ou porque os dois estarão embriagados ou porque não se mantêm em pé. O máximo que dá para fazer é uma declaração de intenções.
— Ai, amor, eu queria tanto comemorar.
— Eu também, temos uma vida pela frente.
— Não ficará chateada?
— Claro que não, eu desejava…
— Zzzzzzzzzz.
E ambos entendem que mentir não é tão bom quanto dormir de conchinha.


quinta-feira, 18 de março de 2010

Número 8 - SABEDORIA


Paciência, equilíbrio e intuição representam este número. Repleto de mistério para aqueles que o cercam. Seu lema é a busca da verdade: estuda, analisa e quer provar fatos desconhecidos. Aprecia a leitura e conhecimentos gerais. Seus amigos são poucos, mas criteriosamente escolhidos.
Cuidado com as vibrações negativas de melancolia, reserva, distanciamento e preguiça.