Não estou reclamando, embora isso custe dinheiro. - É para eu não me doer. - Como é que é? Hein? Você se dói? - Eu me dôo o tempo todo. - Aonde? - Dentro, não sei explicar.
Eu quero te dar E quero ganhar o que você me der Eu quero te amar Até não saber mais o que isso é Eu quero querer Igual a você assim sem disfarçar E quero escrever Uma canção de amor para nos libertar
De todos os códigos, hábitos, truques, manias Que insistem em estar No meio, no centro, no canto da gente Em lugares que eu não quero andar
Eu só quero te dar E quero ganhar o que você me der Eu quero te amar Até não saber mais o que isso é Eu quero querer Igual a você assim sem disfarçar E quero escrever Uma canção de amor para nos libertar
De cada imagem errada Que a velha palavra usada nos trás De tudo que signifique Que para sermos um temos que ser iguais
Eu só quero te dar E quero ganhar o que você me der Eu quero te amar Até não saber mais o que isso é Eu quero querer Igual a você assim sem disfarçar E quero escrever Uma canção de amor para nos libertar.
Juro beijar teu corpo sem descanso
Como quem sai sem rumo prá viagem.
Vou te cruzar sem mapa nem bagagem,
Quero inventar a estrada enquanto avanço.
Beijo teus pés, me perco entre teus dedos.
Luzes ao norte, pernas são estradas
Onde meus lábios correm a madrugada
Pra de manhã chegar aos teus segredos.
Como em teus bosques. Bebo nos teus rios.
Entre teus montes, vales escondidos.
Faço fogueiras, choro, canto e danço.
Línguas de lua varrem tua nuca.
Línguas de sol percorrem tuas ruas.
Juro beijar teu corpo sem descanso.
-Tinha suspirado... Tinha beijado o papel devotadamente.
Era a primeira vez que lhe escreviam aquelas sentimentalidades, E o seu orgulho dilatava-se ao calor amoroso que saía delas Como um corpo ressequido que se estira num banho tépido. Sentia um acréscimo de estima por si mesma, E parecia-lhe que entrava enfim Numa existência superiormente interessante; Onde cada hora tinha o seu encanto diferente... Cada passo conduzia a um êxtase... E a alma se cobria de um luxo radioso de sensações.
Sou sua noite, sou seu quarto
Se você quiser dormir
Eu me despeço
Eu em pedaços
Como um silêncio ao contrário
Enquanto espero
Escrevo uns versos
Depois rasgo
Sou seu fado, sou seu bardo
Se você quiser ouvir
O seu eunuco, o seu soprano
Um seu arauto
Eu sou o sol da sua noite em claro,
Um rádio
Eu sou pelo avesso
sua pele, o seu casaco
Se você vai sair,
O seu asfalto
Se você vai sair
Eu chovo
Sobre o seu cabelo pelo seu itinerário
Sou eu o seu paradeiro
Em uns versos que eu escrevo
Depois rasgo
Mas não é preciso muito. Nunca havia notado que não era necessário ir até a Fontana di Trevi para dizer “Seja minha.” Ser justo e correto, apenas isso, sempre. Tanto os puros quanto os pecadores vão à igreja e rezam; eu vou à sua casa e lavo a louça, como um ato de devoção.
Eu não bebo. Odeio cigarro. Sou vegetariano. Não fico fodendo por aí. Nunca procurei uma prostituta e nunca tive nenhuma doença sexualmente transmissível, além de sapinho. Posso não ser o único, mas que sou uma raridade, isso sou.
Debaixo da ponte do arcebispo, junto a uma verdadeira
corte dos milagres, reúnem-se os mendigos.
Mendigos cristãos, mendigos ateus, mendigos budistas,
mendigos muçulmanos, mendigos judeus.
Enfim, mendigos de todas as cores.
Discutem o resultado do sim e não a suas petições.
Discutem a desvalorização da moeda e
a proliferação de falsos mendigos.
O mendigo cristão fala da perda de
prestígio da caridade nos dias de hoje.
O mendigo ateu disserta sobre o não-deus e
suas pouco eficazes prédicas no deserto.
O mendigo budista fala das dificuldades atuais de
que padece a transparência do nirvana.
O mendigo muçulmano insiste na urgência de
alguns fanatismos em nome de Alah.
O mendigo judeu lamenta que freqüentes ataques de
ira de Jeovah caiam sobre sua cabeça.
E o mendigo de outras cores se queixa das
queixas dos mendigos queixosos.
Depois, tudo termina e os peregrinos voltam às
suas respectivas igrejas, maldizendo
os usurpadores de seus respectivos direitos.
Quem sonha mais,
Eu ou tu? Tu que vives inconsciente,
Ignorando este horror que é existir,
Ser, perante o [profundo] pensamento
Que o não resolve em compreensão, tu
Ou eu, que analisando e discorrendo
E penetrando [...] nas essências,
Cada vez sinto mais desordenado
Meu pensamento louco e sucumbido.
Cada vez sinto mais como se eu,
Sonhando menos, consciência alerta
Fosse apenas sonhando mais profundo
(...) o amor só poderia ser isso, um arrebatamento, um enlevo, e um corpo dentro de outro corpo, desfazendo-se numa impossível simetria, você pensava, o amor só poderia ser isso, essa conquista, essa captura, pois agora tudo meu era teu, a minha espera, o meu receio, e toda alegria e todo assombro, e até as palavras que eu não disse eram tuas, e você pensando que isso deveria ser o amor, quando se perde o medo, e nada mais te fere, e nada mais te escapa, agora que você era capaz de tudo, agora que minha desordem te envolvia e te enlaçava. Porque, finalmente, a nossa força e a nossa fraqueza e o vai-e-vem insistente e a distância, e essa linha que nos unia, como se você estendesse entre nós um atalho, uma ponte, e repetisse, vezes sem fim, que era teu o que quisesse, pois o amor era isso, quando, finalmente se perde o medo, o medo que nos paralisa, o medo que nos detém, e se é capaz das coisas mais belas e espantosas, como amar e construir uma ponte para o outro corpo, a tua mão, e você pensava que aquilo deveria ser o amor, depois da guerra e da derrota e do medo, o amor, esse vínculo que nos une e nos destrói, e você pensava, o amor deve ser isso, estender uma ponte e atravessá-la e destruí-la (...)
A vida bate como um relógio. Um arfar de vento no capim. É fome que rói as entranhas, facho que ilumina os olhos, percorre o corpo em incêndio e queima os lábios de paixão. Um cheiro de carne, de vinho, de fruta recém-tirada do pé. A vida recende violenta, por que não abocanhá-la inteira, cruel, vermelha, suculenta, escorrendo sangue pelos dentes?
Sendo sincero, eu não te amo com meus olhos,
Porque eles em ti notam milhares de erros,
Mas é meu coração que ama o que eles desprezam,
Que ao invés de ver se contenta em seu apaixonar.
Nem minhas orelhas com o som de sua língua que encanta,
Nem carinhoso sentimento é despertado por um simples toque,
nem gosto, nem um cheiro provocante surge
Em algum deleite sensual contigo sozinha;
Mas meus cinco juízos, nem meus cinco sentidos podem
Despersuadirem meu coração tolo de te servir,
Que deixa descontrolada a aparência de um homem,
Teu corações orgulhosos escravos e vassalos infelizes serão:
Só minha praga, portanto longe eu estimo minha vitória,
Que ela faça minha dor merecedora de pecado.
Você sabe tão bem quanto eu que uma das principais causas do tédio é a estreiteza de nosso destino. Todas as manhãs despertamos iguais ao que éramos na véspera. Ser eternamente o mesmo é insuportável para os espíritos refinados pela reflexão. Sair do próprio eu é um dos sonhos mais inteligentes que um homem pode ter.