sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

Ticcia


A verdade, mais tola e mais simples, mais certa e mais secreta é que me fazes falta, esse vácuo, esse oco sem precisão ou contorno, sem nome ou lógica. Tu me fazes falta e me fazes carregar comigo uma ausência indefinível e perpétua, um esgar que é antes um tatear no vazio do que um estender de mão em direção a algo. Tu me fazes falta, me cavas um buraco, pões em meu rosto um borrão que não me desfigura, antes me torna um enigma para mim mesma. E venho me definindo e me reconfigurando ao redor disto: da tua falta. Sou esta que se ressente da tua ausência sem saber mais sequer como é a tua presença, que forma tem o teu corpo, qual o cheiro do teu hálito, qual a cor dos teus olhos, que gosto tem a tua boca assim que despertas. E, no entanto sei disso: me fazes falta, essa falta ampla e completa que toma o dia cada vez que me vem o teu nome, essa falta que abre uma fresta no tempo, que suspende os ruídos do mundo, que modifica a direção do vento e que toma o centro de mim e ao redor da qual eu brinco de ser uma outra, que eu inventei para parecer que continuei vivendo.

segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

Cecília Meireles

Não sejas o de hoje.
Não suspires por ontens...
não queiras ser o de amanhã.
Faze-te sem limites no tempo.
Vê a tua vida em todas as origens.
Em todas as existências.
Em todas as mortes.
E sabes que serás assim para sempre.
Não queiras marcar a tua passagem.
Ela prossegue:
É a passagem que se continua.
É a tua eternidade.
És tu.

Ed René Kivitz in Vivendo com Propósitos


Amar é estar disposto a morrer, pelo menos ser como um morto – um ausente, não-existente – para aquele que se ama. Indo mais longe, amar é abrir mão de tudo, inclusive de si mesmo. O Diabo quer expandir-se e engolir tudo para tudo chamar de “eu”. Deus quer esvaziar-se. Nós estamos entre estes dois arquétipos: existir em favor do outro, numa parceria de amor ou existir em função do eu, numa guerra tirânica entre egos.

Rubem Alves


Quem, por medo do terrível, prefere o caminho prudente de fugir do risco, já nesse ato estará morto. Porque o medo lhe terá roubado aquilo que de mais precioso existe na vida humana: a capacidade de se arriscar para viver o que se ama.

Mia Couto (fragmentos)


ü
* A beleza daquela mulher era de fazer fugir o nome das coisas.
* Nos olhamos como se reconhecêssemos, no outro, o único ser da terra.
* Viver é cumprir sonhos, esperar notícias.
* Não viver é o que mais cansa.
* Não chegamos realmente a viver durante a maior parte da nossa vida. Desperdiçamo-nos numa espraiada letargia a que, para nosso próprio engano e consolo, chamamos existência.
* O amor é um território onde não se pode dar ordens.
* Tememos a morte, sim. Mas nenhum medo é maior que aquele que sentimos da vida cheia, da vida vivida a todo o peito.