domingo, 27 de março de 2011

Patrícia Antoniete


Porque eu te amo num desesperado recomeço de agruras, numa plenitude de maré incerta e vazante, eu te digo que a mim não bastam os anos, as palavras benditas, não basta a língua tão longe das feridas ou um naufrágio a muitos metros da superfície. Porque eu te amo pequena e límpida como água na concha das mãos, pousada sobre teus lábios, cônscia de tua sede, eu sei que tu me inventaste os prumos, os rumos, as vertentes, tu me puseste os olhos, tu me fundaste o ventre. Porque eu te amo em estilhaços e rompantes, nos rasgos da carne, no roçar dos dentes, no ar pouco entre as bocas urgentes, na aflição dos pecados, eu te quero no descanso dos braços, no enrodilhar desacertado das pernas e num tanto de insanidade para compensar a espera. Porque eu te amo imensa e lasciva, fêmea, vulva, viva, impregnada dos teus sumos, grande e alta como me fazem teus gestos, como me dizem teus olhos, como me ensina teu corpo, (...) Porque te amo, tanto, e mais, e contudo, que te amo e emudeço aos gritos do sol fugidio no teu rosto.
(...)
Apaixone-se por mim. Não um amor de mesa posta, talheres de prata, toalha de renda, não um amor de terça-feira, água morna, gaveta arrumada. Apaixone-se por mim no meio de uma tarde de chuva, rua alagada, rosas na mão, um amor faminto, urgente, latejante, um amor de carne, sangue e vazantes, um amor inadiável de perder o rumo o prumo e o norte, me ame um amor de morte. Não me dê um amor adestrado que senta, deita, rola e finge de morto, que late, lambe e dorme. Apaixone-se felino, sorrateiramente e assim que eu me distrair me crave os dentes, as unhas, role comigo e perca-se em mim e seja tão grande a ponto de me deixar perder. Ame minha (...) carne, me fecunde e se espalhe por meus versos, meus reversos, meus entalhes.

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