terça-feira, 8 de janeiro de 2008

Definições...

Adriana FalcãoSolidão é uma ilha com saudade do barco.
Saudade é quando o momento tenta fugir da lembrança para acontecer de novo e não consegue.
Lembrança é quando, mesmo sem autorização, seu pensamento reapresenta um capítulo.
Autorização é quando a coisa é tão importante que só dizer "eu deixo" é pouco.
Pouco é menos da metade.
Muito é quando os dedos da mão não são suficientes.
Desespero são dez milhões de fogareiros acesos dentro de sua cabeça.
Angústia é um nó muito apertado bem no meio do sossego.
Agonia é quando o maestro de você se perde completamente.
Preocupação é uma cola que não deixa o que ainda não aconteceu sair de seu pensamento.
Indecisão é quando você sabe muito bem o que quer mas acha que devia querer outra coisa.
Certeza é quando a idéia cansa de procurar e pára.
Intuição é quando seu coração dá um pulinho no futuro e volta rápido.
Pressentimento é quando passa em você o trailer de um filme que pode ser que nem exista.
Renúncia é um não que não queria ser ele.
Sucesso é quando você faz o que sempre fez só que todo mundo percebe.
Vaidade é um espelho onisciente, onipotente e onipresente.
Vergonha é um pano preto que você quer pra se cobrir naquela hora.
Orgulho é uma guarita entre você e o da frente.
Ansiedade é quando sempre faltam 5 minutos para o que quer que seja.
Indiferença é quando os minutos não se interessam por nada em especial.
Interesse é um ponto de exclamação ou de interrogação no final do Sentimento.
Sentimento é a língua que o coração usa quando precisa mandar algum recado.
Raiva é quando o cachorro que mora em você mostra os dentes.
Tristeza é uma mão gigante que aperta seu coração.
Alegria é um bloco de Carnaval que não liga se não é Fevereiro...
Felicidade é um agora que não tem pressa nenhuma.
Amizade é quando você não faz questão de você e se empresta pros outros.
Decepção é quando você risca em algo ou em alguém um xis preto ou vermelho.
Desilusão é quando anoitece em você contra a vontade do dia.
Culpa é quando você cisma que podia ter feito diferente, mas, geralmente, não podia.
Perdão é quando o Natal acontece em outra ápoca do ano.
Desculpa é uma frase que pretende ser um beijo.
Excitação é quando os beijos estão desatinados pra sair de sua boca depressa.
Desatino é um desataque de prudência.
Prudência é um buraco de fechadura na porta do tempo.
Lucidez é um acesso de loucura ao contrário.
Razão é quando o cuidado aproveita que a emoção está dormindo e assume o mandato.
Emoção é um tango que ainda não foi feito.
Ainda é quando a vontade está no meio do caminho.
Vontade é um desejo que cisma que você é a casa dele.
Desejo é uma boca com sede.
Paixão é quando apesar da palavra "perigo" o desejo chega e entra.
Amor é quando a paixão não tem outro compromisso marcado. Não. Amor é um exagero... também não. É um "desadoro"... Uma batelada? Um exame, um dilúvio, um mundaréu, uma insanidade, um destempero, um despropósito, um descontrole, uma necessidade, um desapego? Talvez porque não tivessesentido, talvez porque não houvesse explicação, esse negócio de amor não sei explicar.

O querer

Márcia MaiaSe não doesse como se saberia quão bom não doer seria?
Caio Fernando AbreuNum deserto de almas também desertas, uma alma especial reconhece de imediato a outra.

Saudade...

Márcia Maia Essa coisa que dá um nó na gente, que aperta, aperreia e faz chorar, e não tem jeito claro pra explicar que diacho é aquilo que se sente. Mais parece ser coisa de demente, não é raiva ou tristeza, nem mania, nem remorso ou amor, nem latomia, alegria, então, mesmo é que não é, é uma falta de ver quem ver se quer, é querer ter quem tanto se queria.

SOU QUANDO DEIXO DE SER

Fabrício CarpinejarQuando amo, nunca me vejo tão próprio. Sou possível. Sou véspera. Viera para ler minha vida. A praia amarelada é meu rosto pensando. O marulhar não me distrai. Os pássaros escoltam a luz até o alto-mar. Os barcos se soltam como bóias e recolhem promessas de Navegantes. Não há guerra civil. O espelho antigo perdoa as rugas que chegaram depois. As mãos são lábios apertados. O lápis não quebra a ponta ao sugerir quadros. Mas quando amo não sou eu. Quando amo, me esvazio de mim para ser ela. Eu me anulo para ser ela. Não compreendo como sou mais eu logo quando não sou. Como me sinto pleno quando saí de mim. Como me sinto lúcido ao desarticular o senso. Como me sinto guardado ao me desperdiçar. Ao me sacrificar, acredito que me reencontrei. Quando amo cedo minhas convicções, meus preconceitos, minhas verdades. Abdico para dar lugar a quem chega com sua escova de dente e seus xampus. Abro espaço no armário, vinco as roupas prediletas. Renuncio a lonjura da cama. Capaz de dormir na esquerda, mudar os hábitos e ler o jornal por segundo. Deixo o jogo passar sem consultar o rádio. Quero agradar mesmo que signifique me desagradar. Eu me bajulo de contradições e censuras. Pergunto o que ela deseja para - se sobrar tempo - me perguntar. Antecipo-me nela para me atrasar em mim. Ainda que ela me condene, seguirei a absolvendo e reincidindo. Ainda que ela me abandone, seguirei tentando e insistindo. Ainda que me destrate, inventarei motivos para procurá-la. Privo-me da vergonha, da reputação, da moralidade, para esmolar meu corpo de volta. Ou o que julgava corpo antes de encontrá-la. O corpo é a generosidade de perdê-lo. O corpo é o espaço entre ela e eu. Amar e viver não são simultâneos. Diria até que são excludentes. Ambos exigem muito para coexistirem. Posso ter vivido e não amado, posso ter amado e não vivido. É impossível sarar de um amor. Escapo-me do que sou, mas não daquilo que preciso e que não encontro sozinho. O amor mostra que qualquer coisa é modificável, qualquer passado, qualquer temperamento, menos o amor. No amor, somos tudo, menos a gente.