domingo, 22 de maio de 2011

José Luis Peixoto


O amor é o sangue do sol dentro do sol. A inocência repetida mil vezes na vontade sincera de desejar que o céu compreenda. Levantam-se tempestades frágeis e delicadas na respiração vegetal do amor. Como uma planta a crescer da terra. Algo dentro de qualquer coisa profunda. O amor é o sentido de todas as palavras impossíveis. Atravessar o interior de uma montanha. Correr pelas horas originais do mundo. O amor é a paz fresca e a combustão de um incêndio dentro, dentro, dentro, dentro, dentro dos dias. Em cada instante de manhã, o céu a deslizar como um rio. À tarde, o sol como uma certeza. O amor é feito de claridade e da seiva das rochas. O amor é feito de mar, de ondas na distância do oceano e de areia eterna. O amor é feito de tantas coisas opostas e verdadeiras. Nascem lugares para o amor e, nesses jardins etéreos, a salvação é uma brisa que cai sobre o rosto suavemente. Eu acreditava mesmo que o amor é o sangue do sol dentro do sol.

Herman Hesse


Quanto mais envelhecia, quanto mais insípidas me pareciam as pequenas satisfações que a vida me dava, tanto mais claramente compreendia onde eu deveria procurar a fonte das alegrias da vida. Aprendi que ser amado não é nada, enquanto amar é tudo (...). O dinheiro não era nada, o poder não era nada. Vi tanta gente que tinha dinheiro e poder, e mesmo assim era infeliz. A beleza não era nada. Vi homens e mulheres belos, infelizes, apesar de sua beleza. Também a saúde não contava tanto assim. Cada um tem a saúde que sente. Havia doentes cheios de vontade de viver e havia sadios que definhavam angustiados pelo medo de sofrer. A felicidade é amor, só isto. Feliz é quem sabe amar. Feliz é quem pode amar muito. Mas amar e desejar não é a mesma coisa. O amor é o desejo que atingiu a sabedoria. O amor não quer possuir. O amor quer somente amar.

Octávio Paz


Todos os dias atravessamos a mesma rua ou o mesmo jardim,todas as tardesnossos olhos batem no mesmo muro avermelhado, feito de tijolos e de tempo urbano. De repente, num dia qualquer, a rua dá para um outro mundo, o jardim acaba de nascer, o muro fatigado se cobre de signos. Nunca os tínhamos visto e agora ficamos espantados por eles serem assim: tanto e tão esmagadoramente reais.Sua própria realidade compacta nos faz duvidar: são assim as coisas ou são de outro modo? Não, isto que estamos vendo pela primeira vez, já havíamos visto antes. Em algum lugar, no qual nunca estivemos, já estavam o muro, a rua, o jardim. E à surpresa segue-se a nostalgia. Parece que nos recordamos e queríamos voltar para lá, para esse lugar onde as coisas são sempre assim, banhadas por uma luz antiqüíssima e ao mesmo tempo acabada de nascer. Nós também somos de lá. Um sopro nos golpeia a fronte. Adivinhamos que somos de outro mundo...

Friedrich W. Nietzsche


O que se pode prometer. Pode-se prometer ações, mas não sentimentos, pois estes são involuntários. Aquele que promete a alguém amar-lhe sempre ou odiar-lhe ou ser-lhe sempre fiel promete algo que não está em seu poder; o que se pode prometer são ações que, em verdade, são ordinariamente as conseqüências do amor, do ódio, da felicidade, mas que podem também provir de outros sentimentos, pois a uma mesma ação conduzem caminhos e motivos diferentes. Por conseguinte, a promessa de amar sempre a uma pessoa significará: enquanto eu te ame, prodigarizarei por ti as ações do amor; se deixo de amar-te, continuarás recebendo de mim as mesmas ações, ainda que por outros motivos, de sorte que na cabeça dos demais homens persista a aparência de que o amor será imutável e sempre o mesmo. Promete-se também a persistência da aparência do amor quando, sem cegar-se a si mesmo, se promete a alguém um amor eterno.