domingo, 27 de janeiro de 2008

Lia LuftTenho medo da dor de tua ausência que me queima por dentro. E da ternura eu tenho medo, dessa beleza das noites secretas quando chegas sempre como se fosse a única vez. Tenho medo de que um dia queiras cessar esse rio de águas ardentes onde mais do que os corpos tocam-se as almas, anjos desatinados luzindo no breu.

"Mas há a vida que é para ser intensamente vivida,

há o amor.

Que tem que ser vivido até a última gota.

Sem nenhum medo.

Não mata."


"Gosto de ti e do mundo que te acompanha."

Não se come uma mulher

Fabrício Carpinejar

Não sou adepto de enxergar o mundo como se fosse a primeira vez, muito menos enxergar o mundo como a última vez. Não caio na conversa fiada de estréia e de despedida. Despedir não é terminar - é procurar iniciar de um jeito diferente.

Sou homem do durante. Do meio. Do decorrer. Nada contra quem pensa o contrário, mas é um pouco de soberba inaugurar ou fechar o mundo.

Quando se ama uma mulher, é preciso a safadeza, a vontade sem pudor, o desejo diabólico, a tara. Não se conter, não se represar. A ânsia, a violência e a obsessão são permitidas. Mas tudo será grosseria desacompanhada da pureza.

Pureza é autenticidade. Não fingir, não disfarçar, não dizer o que não está sentindo. Já ouvi muito que sexo não é seguir a cabeça e deixar as coisas aconteceram. Sexo seria não pensar. Não concordo, sexo não é inconseqüência, é conseqüência da gentileza. Conseqüência de ouvir o sussurro, de ser educado com o sussurro e permanecer sussurrando. Perder o pudor, não perder o respeito. Perder a timidez, não perder o cuidado.

Sexo é pensar, como que não? E fazer o corpo entender a pronúncia mais do que compreender a palavra. Como se não houvesse outra chance de ser feliz. Não a derradeira chance, e sim a chance.

Uma mulher está sempre iniciando o seu corpo. Toda a noite é um outro início. Toda a noite é um outro homem ainda que seja o mesmo. Não se transa com uma mulher pela repetição. Seu prazer não está aprendendo a ler. Seu prazer escreve - e nem sempre num idioma conhecido.

Ela pode ficar excitada com uma frase. Não é colocando de repente a mão na coxa. Ela pode ficar excitada com uma música ou com uma expressão do rosto. Não é colocando a mão na sua blusa. Mulher é hesitação, é véspera, é apuro do ouvido.

Antever que aquelas costas evoluem nas mãos como um giz de cera. Reparar que a boca incha com os beijos, que o pescoço não tem linha divisória com os seios, que a cintura é uma escada em espiral.

É comum o homem, ao encontrar sua satisfação, recorrer a uma fórmula. Depois de sucesso na intimidade, acredita que toda mulher terá igual cartografia, igual trepidação. Se mordiscar os mamilos deu certo com uma, lá vai ele tentar de novo no futuro. Se brincou de chamá-la de puta, repete a fantasia interminavelmente. Assim o homem não vê a mulher, vê as mulheres e escurece a nudez junto do quarto.

Amar não é uma regra, e sim onde a regra se quebra.

Não se come uma mulher, ela é que se devora.

Luiz VilelaTambém não reajo contra o sentimento romântico que me domina. Por que esta preocupação de parecer o que não somos?
Ponham-me a data de 1830, mas a verdade é que esses sentimentos são de natureza eterna, e é inútil situá-los em outras épocas. Não se pode negar o homem.

Felicidade

Heinrich Heine


Oh, que dama fácil, a felicidade!
Mal se acostuma num lugar, ela já sai...
Afaga teu cabelo, cheia de vaidade,
beija-te às pressas, bate as asas e se vai.
Dona infelicidade, ao contrário,
te prende ao coração a ferro e corda.
Para ir embora, diz não ter horário,
senta-se contigo à cama e borda.