quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

José Eduardo Agualusa


Eu creio firmemente que é pela poesia que tudo vai começar.

Manoel de Barros

Uso a palavra para compor meus silêncios. Não gosto das palavras fatigadas de informar. Dou mais respeito às que vivem de barriga no chão, tipo água, pedra, sapo. Entendo bem o sotaque das águas. Dou respeito às coisas desimportantes e aos seres desimportantes. Prezo insetos mais que aviões. Prezo a velocidade das tartarugas mais que a dos mísseis. Tenho em mim esse atraso de nascença. Eu fui aparelhado para gostar de passarinhos. Tenho abundância de ser feliz por isso. Meu quintal é maior do que o mundo. Sou um apanhador de desperdícios: amo os restos, como as boas moscas. Queria que a minha voz tivesse um formato de canto. Porque eu não sou da informática: sou da invencionática... Só uso a palavra para compor meus silêncios.

Cristovão Tezza


(...), e ao mesmo tempo intrometeu-se a idéia de que ela gosta de literatura pesada, de becos sem saída, de agressões surdas, de aporias, incomunicabilidades exasperantes e gaguejantes – mas só na literatura, na vida ela quer final feliz, (...) na vida ela quer se sentir bem e se sentir amada, na vida ela quer a doce sensação de permanência – a doce sensação de permanência – ela sussurrou, será que isso é bom?