domingo, 11 de outubro de 2009

Índio Tamoio Prado


Se vida é ter a gente a alma retida
no cárcere do corpo, de tal sorte
que ela a seu jugo torne-se vencida;
então a vida não é vida... é morte!

Se morte é o eximir-se a alma
do forte grilhão da carne
alçando-se para o alto céu num rápido transporte;
então a morte não é morte... é vida!

Se vida é d´alma a escravidão que humilha,
treva que envolve a estrada que ela trilha;
se morte é a mutação da sua sorte,
é a volta sua livre à luz perdida...

Então, por que esse apego que se tem à vida?
Por que esse medo que se tem da morte?

Fernando Pessoa

Abdicação

Toma-me, ó noite eterna, nos teus braços

E chama-me teu filho...

eu sou um rei

que voluntariamente abandonei

o meu trono de sonhos e cansaços.
Minha espada, pesada a braços lassos,

Em mão viris e calmas entreguei;

E meu cetro e coroa - eu os deixei

Na antecâmara, feitos em pedaços
Minha cota de malha, tão inútil,

Minhas esporas de um tinir tão fútil,

Deixei-as pela fria escadaria.
Despi a realeza, corpo e alma,

E regressei à noite antiga e calma

Como a paisagem ao morrer do dia.