Ela tinha ímpeto de desaparecer, virar espuma, vento, soprar longe. Se sentia culpada quando essa vontade tomava conta dos seus pensamentos, sempre rodeada de sons, vozes, música, amor, superproteção que ela não pedia.Tinha gana de desligar os telefones, o interfone, desligar-se.Não era egoísmo puro e simples, era saudade dela.Sentia falta de rir sozinha lendo seus livros, acender incenso tomando banho quente, andar pela casa com sua camiseta surrada, descalça, distraída, relaxada, ver seus filmes antigos tomando café forte, queria sua companhia de volta, não definitivamente (solidão nunca a seduziu), pois amava estar com os seus.Gostava de ser acolhida, mimada, mas algumas vezes, um filme, um café, pés descalços, lhe bastava.
domingo, 31 de outubro de 2010
Fernanda Mello
Eu não sou linear. Eu não sou uma pessoa terminada, eu não quero rótulos nem roteiros prontos, não existe começo nem fim em mim. Eu existo. Não sou produto, sou só coração. Vivo em um meio que me parece eterno. Um meio que me faz escrever, ser e mudar a cada dia. Se eu começasse a escrever minha vida, seria assim: … Percebe? Eu sei que sim. Eu sou reticências. Sou 3 pontinhos. Sou o não-dito. Sou emoção e desejo. Palavras são o meu antídoto. Anti-monotonia, anti mau-humor, anti todo o amor que não há.
Marla de Queiroz
O que me interessa no amor, não é apenas o que ele me dá, mas principalmente, o que ele tira de mim: a carência, a ilusão de autossuficiência, a solidão maciça, a boemia exacerbada para suprir vazios. Ele me tira essa disponibilidade eterna para qualquer um, para qualquer coisa, a qualquer hora. Ele apazigua o meu peito com uma lista breve de prós e contras. Mas me dá escolhas. Eu me percebo transformada pelo que o amor tirou de mim por precisar de espaço amplo e bem cuidado para se instalar. O amor tira de mim a armadura, pois não consigo controlar a vulnerabilidade que vem com ele; tira também a intransigência. O amor me ensina a negociar os prazos, a superar etapas, a confiar nos fatos. O amor tira de mim a vontade de desistir com facilidade, de ir embora antes de sentir vontade, de abandonar sem saber por quê. E é por isso que o amor me assombra tanto quanto delicia. Porque não posso virar as costas pra uma mania quando ela vem de uma pessoa inteira. Porque eu não posso fingir que quero estar sozinha quando o meu ser transborda companhia. O amor me tira coisas que eu não gosto, coisas que eu talvez gostasse, mas me dá em dobro o que nunca tive: um namoramento por ele mesmo. O amor me tira aquilo que não serve mais e que me compunha antes. O amor tirou de mim tudo que era falta.
Martha Medeiros
(...) a inquietação que nos torna insuportavelmente exigentes com a gente mesmo e a ambição de vencer não os jogos, mas o tempo, este adversário implacável. Desassossegados do mundo correm atrás da felicidade possível, e uma vez alcançado seu quinhão, não sossegam: saem atrás da felicidade improvável, aquela que se promete constante, aquela que ninguém nunca viu, e por isso sua raridade.
Desassossegados amam com atropelo, cultivam fantasias irreais de amores sublimes, fartos e eternos, são sabidamente apressados, cheios de ânsias e desejos, amam muito mais do que necessitam e recebem menos amor do que planejavam.
Desassossegados pensam acordados e dormindo, pensam falando e escutando, pensam ao concordar e, quando discordam, pensam que pensam melhor, e pensam com clareza uns dias e com a mente turva em outros, e pensam tanto que pensam que descansam.
(..) Desassossegados têm insônia e são gentis, lhes incomodam as verdades imutáveis, riem quando bebem, não enjoam, mas ficam tontos com tanta idéia solta, com tamanha esquizofrenia, não se acomodam em rede, leito, lamentam a falta que faz uma paz inconsciente. Desta raça somos todos, eu sou, só sossego quando me aceito.
Denise Portes
Ninguém falou que ia ser fácil, todo dia a gente tem que fazer escolha, se acalmar e seguir. Andar com fé, se reinventar. Os pensamentos em movimentos os sonhos que se desmancham, cada vez que duvidamos deles. Mas é domingo e parece que o tempo nesse dia anda mais lento, uma trégua de um vai e vem constante. Deixo vagar a alma por labirintos de luz, procuro horizontes que me tragam sempre um pouco mais de paz.
Elizabeth Gilbert
Se você tem a coragem de deixar para trás tudo que lhe é familiar e confortável (pode ser qualquer coisa, desde a sua casa aos seus antigos ressentimentos) e embarcar numa jornada em busca da verdade (para dentro ou para fora), e se você tem mesmo a vontade de considerar tudo que acontece nessa jornada como pista e se você aceitar cada um que encontre no caminho como professor, e se estiver preparada, acima de tudo, para encarar (e perdoar) algumas realidades bem difíceis sobre você mesma... então a verdade não lhe será negada.
quinta-feira, 28 de outubro de 2010
Amor talhado na árvore. Ainda continuo contando as contas do conto...
Ninguém me fará calar, gritarei sempre
que se abafe um prazer, apontarei os desanimados,
negociarei em voz baixa com os conspiradores,
transmitirei recados que não se ousa dar nem receber,
serei, no circo, o palhaço,
serei, médico, faca de pão, remédio, toalha,
serei bonde, barco, loja de calçados, igreja, enxovia,
serei as coisas mais ordinárias e humanas, e também as excepcionais:
tudo depende da hora
e de certa inclinação feérica,
viva em mim qual um inseto.
Idade madura em olhos, receitas e pés, ela me invade
com sua maré de ciências afinal superadas.
Posso desprezar ou querer os institutos, as lendas,
descobri na pele certos sinais que aos vinte anos não via.
que se abafe um prazer, apontarei os desanimados,
negociarei em voz baixa com os conspiradores,
transmitirei recados que não se ousa dar nem receber,
serei, no circo, o palhaço,
serei, médico, faca de pão, remédio, toalha,
serei bonde, barco, loja de calçados, igreja, enxovia,
serei as coisas mais ordinárias e humanas, e também as excepcionais:
tudo depende da hora
e de certa inclinação feérica,
viva em mim qual um inseto.
Idade madura em olhos, receitas e pés, ela me invade
com sua maré de ciências afinal superadas.
Posso desprezar ou querer os institutos, as lendas,
descobri na pele certos sinais que aos vinte anos não via.
(Carlos Drummond de Andrade)
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Estranho, sim. As pessoas ficam desconfiadas, ambíguas diante dos apaixonados. Aproximam-se deles, dizem coisas amáveis, mas guardam certa distância, não invadem o casulo imantado que envolve os amantes e que pode explodir como um terreno minado, muita cautela ao pisar nesse terreno. Com sua disciplina indisciplinada, os amantes são seres diferentes e o ser diferente é excluído porque vira desafio, ameaça. Se o amor na sua doação absoluta os faz mais frágeis, ao mesmo tempo os protege como uma armadura. Os apaixonados voltaram ao Jardim do Paraíso, provaram da Árvore do Conhecimento e agora sabem. (Lygia Fagundes Telles)
sexta-feira, 22 de outubro de 2010
Fernanda Mello
Tudo com o que eu me importo, "me importa muito". Me suga, me leva, me atrai, se funde com tudo o que sou e me consome. Toda. Por inteiro. Sorte minha me doar tanto - e com tal intensidade - e ainda sair viva dessa vida.
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