domingo, 11 de outubro de 2009

Fernando Pessoa

Abdicação

Toma-me, ó noite eterna, nos teus braços

E chama-me teu filho...

eu sou um rei

que voluntariamente abandonei

o meu trono de sonhos e cansaços.
Minha espada, pesada a braços lassos,

Em mão viris e calmas entreguei;

E meu cetro e coroa - eu os deixei

Na antecâmara, feitos em pedaços
Minha cota de malha, tão inútil,

Minhas esporas de um tinir tão fútil,

Deixei-as pela fria escadaria.
Despi a realeza, corpo e alma,

E regressei à noite antiga e calma

Como a paisagem ao morrer do dia.



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